Coluna Economia em foco – 12/02/2020

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Taxa SELIC, dívida pública e investimentos

A SELIC é a taxa de juros mais importante para a economia brasileira. Seu impacto na vida financeira de bancos, empresas e indivíduos é bem direto, uma vez que ela influencia o comportamento de outros indexadores, como o IPCA e o CDI. Recentemente, o Banco Central cortou a taxa SELIC em 0,25 pp, o menor valor desde sua criação em 1986. Mas qual seu impacto nos investimentos pessoais e, talvez mais importante, para o endividamento do governo?

Histórico

De outubro de 2012 a abril de 2013, a taxa Selic foi mantida em 7,25% ao ano e passou a ser reajustada gradualmente até alcançar 14,25% em julho de 2015. Nas reuniões seguintes, a taxa foi mantida nesse nível. Em outubro de 2016, com a instauração de um novo governo e mudanças na política econômica, foi iniciado um longo ciclo de cortes na Selic, quando a taxa caiu 0,25 ponto percentual para 14% ao ano.

Esse processo durou até março de 2018, quando a Selic chegou ao seu mínimo histórico, 6,5% ao ano, e depois disso foi mantida pelo Copom até julho de 2019. De lá para cá, o comitê reduziu os juros básicos consistentemente até 4,25% pp ao ano.

O que é?

O termo SELIC é uma sigla, e significa Sistema Especial de Liquidação de Custódia. Ela é um sistema do Banco Central (BC) que registra todas as operações relacionadas aos títulos escriturais do Tesouro Nacional, e como boa parte destes ativos é comprada pelos grandes bancos, por lei, eles são obrigados a direcionar uma porcentagem de seus depósitos a uma conta do BC.

O volume de operações bancárias em um único dia é enorme. Ao somar o montante de todas as instituições, o total é ainda maior, então, o BC impõe que os bancos devem fechar o dia com o caixa equilibrado. O objetivo é evitar excesso de dinheiro em circulação, que por sua vez, controla a inflação. Para isso, as instituições fazem empréstimos entre elas. Há uma taxa de juros e também a emissão de títulos de curtíssimo prazo (1 dia). Assim, é feita uma média ponderada e ajustada que é divulgada diariamente. Ela é a taxa Selic Overnight. No ano, ela é a taxa Selic anual.  A taxa Selic que conhecemos é a Taxa Selic Meta. Ela é estabelecida pelo Copom (Comitê de Política Monetária). A cada 45 dias, o Copom se reúne para decidir os rumos da taxa básica de juros do próximo período e qual a meta para a SELIC a ser perseguida no ano.

Para que serve?

Os efeitos da SELIC vão muito além da gestão de caixa de bancos. Como a taxa regula os empréstimos interbancários, ela se torna um instrumento vital de controle da inflação. Uma SELIC baixa é, em tese, um estímulo ao crédito, que por sua vez eleva q quantidade de moeda em circulação, elevando consumo e investimento e, consequentemente, os preços. O efeito de uma SELIC alta é o reverso. Serve para retirar liquidez do mercado, diminuindo consumo e controlando aumentos de preços.

Ela tem influência direta nos investimentos pessoais, pois é fortemente atrelada ao CDI. O CDI é o Certificado de Depósito Interbancário. Ele é um título privado, emitido e utilizado apenas entre os bancos, nos empréstimos de curtíssimo prazo. Um dos investimentos mais populares entre os brasileiros é a aplicação em CDI. Tão popular, que muitos fundos de investimento o utilizam como benchmark de sua taxa de performance (o quando o fundo cobra do cliente caso seu desempenho seja maior que o CDI). Porém, a determinação do valor do CDI é feita com base nos juros praticados. Ou seja, ele é a taxa Selic Over. Por isso, a taxa Selic e o CDI são próximos. Basicamente, os empréstimos são feitos a Selic e recebidos em CDI. Portanto, eles são semelhantes para não gerar operações de lucratividade ou prejuízos. Portanto, se a taxa SELIC se encontra em mínimas históricas, muito próximas da inflação, isso significa que os investimentos em CDI já não são mais tão atrativos. Pense o seguinte: se a SELIC de 2019 foi de 4,5% ao ano e a inflação no mesmo período foi de 4,31%, significa que o investidor com títulos atrelados à taxa SELIC teve ganho real de menos de 0,2% no ano.

Também há o impacto nas contas do governo. Um dos títulos de dívida do governo federal são as LFT, ou Letras Financeiras do Tesouro. São títulos com rentabilidade diária vinculada à SELIC. À medida que a SELIC cai, cai também os juros pagos à esta dívida. A diminuição dos juros também acontece indiretamente em outros títulos do governo, como as NTN e LTN, fixadas respectivamente pelo IPCA e por juros pré-fixados. Em 2019, a queda expressiva na taxa SELIC permitiu ao governo economizar mais de R$ 68 bilhões em juros da dívida, um valor maior que o investimento feito pelo governo federal (em torno de R$ 50 bilhões). Há de se torcer para mais cortes, algo que o Copom sinaliza como possível no segundo semestre do no.

Mas, se a SELIC está tão baixa, como os juros do meu cartão de crédito continuam altíssimos? Explicarei isso na próxima semana.

Professor do curso de Ciências Econômicas da UNESC, mestre em Economia do Desenvolvimento pela PUCRS e doutorando em Economia pela UNISINOS.

Contato: ismaelcittadin@gmail.com