Em resposta à ação de Criciúma, caso se arrastava há 14 anos na Suprema Corte
Da Redação
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na quinta-feira (22), que o dever constitucional do Estado de assegurar o atendimento em creche e pré-escola às crianças de até 5 anos de idade é de aplicação direta e imediata, sem a necessidade de regulamentação pelo Congresso Nacional. Por unanimidade, o colegiado também estabeleceu que a oferta de vagas para a educação básica pode ser reivindicada na Justiça por meio de ações individuais.
A questão foi discutida no Recurso Extraordinário (RE) 1008166, Tema 548 da repercussão geral, e a solução deve ser aplicada a, pelo menos, 28.826 processos que tratam da mesma controvérsia e que estavam com a tramitação suspensa (sobrestados) em outras instâncias aguardando a decisão do Supremo. O Plenário seguiu o entendimento do relator do recurso, ministro Luiz Fux, cujo voto foi apresentado em sessão anterior.
O recurso foi apresentado pelo Município de Criciúma (SC) para contestar decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que manteve obrigação à administração local de assegurar reserva de vaga em creche para uma criança. No STF, a prefeitura argumentou que não cabe ao Poder Judiciário interferir nas questões orçamentárias da municipalidade, porque não é possível impor aos órgãos públicos obrigações que importem gastos, sem que estejam previstos valores no orçamento para atender à determinação.
Primeiro a votar na sessão de hoje, o ministro Luís Roberto Barroso observou que, como o direito à educação básica é uma norma constitucional de aplicação direta, uma decisão do Judiciário determinado o cumprimento dessa obrigação não pode ser considerada uma intromissão em outra esfera de poder.
Ele ressaltou que muitos dos direitos constitucionais necessitam de prazo para sua concretização, para que se adequem às necessidades orçamentárias. “Porém, passados 34 anos [da promulgação da Constituição], já não é razoável dizer que a realidade fática ainda não permite essa implementação”, afirmou.
A ministra Rosa Weber (presidente) frisou que a oferta de creche e pré-escola é imprescindível para assegurar às mães segurança no exercício do direito ao trabalho e à família, em razão da maior vulnerabilidade das trabalhadoras na relação de emprego, devido às dificuldades para a conciliação dos projetos de vida pessoal, familiar e laboral. “Em razão da histórica divisão assimétrica da tarefa familiar de cuidar de filhos e filhas, o tema insere-se na abordagem do chamado constitucionalismo feminista”, disse.
Rosa Weber destacou que esse direito social tem correlação com os da liberdade e da igualdade de gênero, pois proporciona à mulher a possibilidade de ingressar ou retornar ao mercado de trabalho. Para a ministra, o direito à educação básica não pode ser interpretado como discricionariedade e sim como obrigação estatal, imposta sem condicionantes, configurando omissão a falta da sua prestação. “Os recursos públicos devem ser bem geridos e, consequentemente, utilizados na aplicação do direito à educação”, enfatizou.
Também votaram acompanhando o relator a ministra Cármen Lúcia e os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
A Decisão, agora com repercussão geral é a seguinte:
1 – A educação básica em todas as suas fases, educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, constitui direito fundamental de todas as crianças e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata.
2 – A educação infantil compreende creche, de 0 a 3 anos, e a pré-escola, de 4 a 5 anos. Sua oferta pelo poder público pode ser exigida individualmente, como no caso examinado neste processo.
3 – O poder público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.
Prefeitura emite nota e explica que caso se arrastava há 14 anos
Sobre decisão do Superior Tribunal Federal (STF), nessa quinta-feira (22), o município de Criciúma esclarece:
Trata-se de processo movido pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, há 14 anos, requerendo, na época, que o Município de Criciúma disponibilizasse vaga em creche para criança, próximo à sua residência.
Com a chegada de uma nova gestão, em 2009, o Governo do Município identificou as áreas que necessitavam de avanços e melhorias, entre elas, a de ofertar vagas em creches. Com a execução do planejamento estabelecido, as vagas ofertadas pelo Município de Criciúma passaram a atender a demanda existente.
Contudo, a ação prosseguiu, e em 2016 o recurso ascendeu ao Supremo Tribunal Federal (STF). Naquela ocasião, ganhou reforço da Confederação Nacional dos Municípios, em razão do interesse de outros municípios, em nível nacional, que ainda possuem tal carência. A tese foi reconhecida com repercussão geral e inúmeros outros entes públicos, tais como município do Rio de Janeiro, Porto Alegre, os Estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Tocantins, entre outros, ingressaram no feito.
Ação que só foi julgada agora
Julgada em 2022, restou definido pelo STF que deverão ser ofertadas tais vagas, devendo comprovar, o interessado, que solicitou o serviço administrativamente, e que não obteve resposta em um prazo razoável, e que não possui condições financeiras para arcar com os custos correspondentes.
Importa esclarecer, no entanto, que, na prática, a decisão não repercutirá para o Município de Criciúma, que vem cumprindo com excelência o atendimento às crianças de 0 a 5 anos, em decorrência das políticas públicas implementadas. Deste modo, todo o pai que busque matricular seu filho na rede pública do Município de Criciúma, será atendido.