Cenário atual do campo se explica pela mudança gradual da matriz econômica do município

Do nascer do sol até o virar do dia. É este o tempo que Dalmir Joaquim dos Santos passa na lavoura, colhendo, cuidando, separando os produtos da terra. Folha por folha passam por suas mãos, em um processo que começa e vai terminar quando não puder mais trabalhar. Para Madeirinha, como é chamado pela família e amigos, que nasceu já no mundo agrícola, a rotina na roça é boa. O extenso espaço disponível, a sombra das árvores nos dias quentes, a quietude; todos esses fatores fazem com que o agricultor não queira outra coisa para si se não a vida no campo.

Com 20 hectares de terra na região do bairro Esperança, em Içara, Dalmir tem como maior produção o fumo, com cerca de 20 mil quilos. Apesar de os pés serem colhidos a partir de dezembro e o movimento com as firmas durarem até o mês de maio, os cuidados e o trabalho com a planta duram o ano inteiro, assim como na lavoura de milho. Colhendo na proximidade de 100 sacas por hectare, a maioria da produção é vendida à silagem, destinada à alimentação animal.

“É muito bom viver no campo, mas também é muito difícil. Toda lavoura depende 90% do clima. Se o clima não ajudar, não temos o que fazer. Perdemos bastante produção por causa disso. Um ano é pela seca, outro por muita chuva. Este ano, por exemplo, foi o granizo”, relata o agricultor. Além das condições climáticas, Dalmir ressalta a não garantia de um dinheiro fixo todo o mês, comparando com os habituais empregos das cidades. A utilização da tecnologia e o aumento de maquinário é fator importante da continuidade nos negócios, pois, como ele mesmo caracteriza, o que na época de seu pai era produzido com oito filhos, hoje é feito por apenas dois.

Loteamento tomando a roça

O grande aumento de loteamentos na região nos últimos tempos é notado pelo agricultor, que frisa o fato dos mais jovens não quererem viver mais da agricultura familiar. O pensamento de o ramo acabar não deixa de passar pela sua cabeça. Ele diz acreditar serem necessários projetos eficazes de incentivo à agricultura, para que os filhos de fazendeiros queiram permanecer na roça. O valor feito inteiramente pelas empresas reflete em uma não valorização do trabalho agrícola, que às vezes chega até mesmo ao desperdício de produtos, de acordo com Dalmir. “Se a pessoa puder trabalhar na agricultura e ter outro ramo para ajudar, seria ótimo. Ganhamos muito pouco e tem sido cada vez mais difícil se expandir nos dias de hoje”, reflete Madeirinha.

Agricultura familiar

Talvez você já tenha visto na sua cestinha do mercado verduras embaladas com a marca do Sítio N. S. do Caravaggio. Salsa, couve-folha, cebolinha, alface mimosa ou americana; com a produção focada em hortaliças, o agricultor Olívio Frasson, de 64 anos, é conhecido pela distribuição de produtos pela cidade. Ele cresceu na plantação de farinha de mandioca e fumo, destaques da região, mas foi com a lavoura de verduras que se consolidou. Hoje, a família inteira ajuda na produção. Com filhos, genros e noras, totalizam seis pessoas.

O trabalho é realizado de segunda a segunda, mas Olívio não passa todas as horas do dia no campo. Seu tempo é dividido para a plantação, cuidado e distribuição, saindo com o caminhão diariamente para os mercados. O produtor considera a agricultura um dos melhores meios para se viver, mas ainda assim, não deixa de mencionar o quão trabalhoso esta atividade é. “É algo que depende inteiramente de nós mesmos. Mas, lutando, se consegue sobreviver”, completa ele.

Setor agrícola em números

As famílias de Dalmir e Olívio fazem parte das 1.800 que vivem da agricultura no município de Içara. Segundo dados da Secretaria Municipal de Agricultura, hoje a cidade possui na distribuição de terras 6.068 lavouras, sendo divididas em arroz, cana-de-açúcar, feijão, milho, entre outras. Apesar de a área agrícola estar passando por um momento de grande diversificação, a produção de fumo continua sendo a de maior destaque em Içara. São 2.000 hectares separados para a planta, que geram o maior retorno em comparação aos demais produtos. O setor agrícola traz anualmente um giro de cerca de R$115 milhões para o município, ficando atrás da indústria e do comércio na questão de arrecadação para o movimento econômico.

No ano de 2018, o setor da agricultura correspondia a 8,75% na representatividade econômica do município, enquanto a indústria e comércio somaram no cálculo do valor adicionado 79,36%. Já no ano de 2019 houve um decréscimo para o agrícola nessa porcentagem, representando 7,58% no movimento econômico. De acordo com o coordenador do Movimento Econômico da Associação dos Municípios da Região Carbonífera (Amrec), Ailson Piva, isso não significa que a produção esteja decaindo, pois ainda que a influência na economia diminua pelo crescimento de outros setores, o rendimento da agricultura obteve um aumento de mais de R$ 2 milhões entre 2018 e 2019. “A agricultura em Içara, hoje em dia, ocupa todo o espaço que era possível. O que é cultivado já é algo de anos, não tem mais chances de aumentar. Já com o setor industrial a situação é diferente, pois a indústria tem espaços apropriados para crescer”, explica ele.

Incentivos à agricultura familiar

Segundo o secretário de Agricultura, Marcelo Bertotti, a exportação agrícola içarense varia de produto para produto. O destino do fumo, como o colhido nas lavouras de Dalmir, é o Rio Grande do Sul, através da empresa Souza Cruz. Já o setor da agricultura familiar, com o cultivo de hortaliças e frutas, focaliza a distribuição na região da Amrec, assim como o milho e o feijão. Segundo Bertotti, cerca de 90% da agricultura de Içara é familiar, em pequenas propriedades e que obtém um bom desenvolvimento.

“Estamos constantemente em busca de novos projetos e procurando melhorar os atuais programas que estão dando certo. Proporcionamos curso de capacitação, para os jovens, de investimento nas propriedades. Hoje, inclusive, temos bons resultados referentes a jovens que estão realizando cursos de agronomia e se instalando nas propriedades dos pais ou voltando para elas”, relata ele. O secretário ainda menciona a parceria com a Epagri para o desenvolvimento de atuais e futuros projetos de incentivo à agricultura familiar, como a feira fixa às sextas-feiras e outro, referente a piscicultura, que está atualmente na câmara. Além disso, Bertotti destaca o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que traz 70% da merenda nas instituições de ensino do município comprada de produtos da agricultura familiar içarense.

O que é Valor Adicionado?

Valor Adicionado trata-se da riqueza produzida no município. Seu cálculo é a diferença do valor obtido com a venda de determinada mercadoria menos a compra, ou seja, aquilo que se agrega de valor. Este valor é anualmente comparado com o ano anterior com a finalidade de avaliar o crescimento econômico do município.

ANO DE 2019  (ESTIMADO) X 2018
SEGUIMENTO 2018 (R$) REPRESENTAÇÃO (2019)
AGROPECUÁRIO/EXTRAÇÃO 114.945.825,94 7,58
COMÉRCIO / COMÉRCIO 1.231.270.818,85 81,20
FRETES 48.669.032,06 3,21
ENERGIA/TELECOM. 121.488.053,43 8,01
TOTAL 1.516.373.730,28 100,00
ANO DE 2018 X 2017
SEGUIMENTO 2018 (R$) REPRESENTAÇÃO (2018)
AGROPECUÁRIO/EXTRAÇÃO 112.231.324,65 8,75
COMÉRCIO / COMÉRCIO 1.018.065.823,51 79,36
FRETES 47.549.121,56 3,71
ENERGIA/TELECOM. 105.019.090,72 8,19
TOTAL 1.282.865.360,44 100,00
ANO DE 2017
SEGUIMENTO 2017 (R$) REPRESENTAÇÃO (2017)
AGROPECUÁRIO/EXTRAÇÃO 122.414.063,86 10,36
COMÉRCIO / COMÉRCIO 898.786.253,41 76,09
FRETES 34.663.578,84 2,93
ENERGIA/TELECOM. 125.278.047,88 10,61
TOTAL 1.181.141.943,99 100,00