Severina Branca

Alguns poetas cantam exaltando a vida sofrida de personagens do cotidiano, como se a literatura já fosse inerente a alma. O poeta Gilmar Leite, do sertão de São José do Egito, cidadezinha pernambucana, em seus versos canta uma louvação a uma prostituta que viveu nos anos 70. No tempo em que as meretrizes eram pobres ou de pouca beleza, vendendo o corpo para alimentar seus filhos, muitas vezes de pais que não assumiram, e sem o amparo dos órgãos governamentais, Severina Branca foi a pioneira naquele recanto sertanejo de pouca fartura.

Na voz de Severina Branca, o poeta Gilmar Leite decanta a alma romântica do “eu oprimido”, esmagada pela solidão e pela brutalidade do mundo. Uma espessa melancolia se apossa dos seus versos, e por todos os lados vê-se o lado sombrio e inútil da existência. Ao sentir que os seus vínculos com o mundo foram rompidos, o poeta apega-se no próprio “eu”. Um “eu” incômodo, estranho, que ameaça ora com o caos, ora com o êxtase, ao mesmo tempo um “eu” angustiado, incapaz de transformar o mundo. O poeta utiliza aspectos da literatura romântica com gritos de subjetividades que confessam seus medos e sofrimentos.

A vida de Severina Branca não era fácil, não sabia ler e ninguém acreditava que ela podia desenvolver uma atividade remunerada. Muitas vezes tentou arrumar um trabalho digno e não o teve. Bateu de porta em porta e criou calos nos pés de tanto andar! Negaram o emprego, negaram o amor e a jogaram na rua, o caminho foi o pior possível, o da “prostituição”.

Acordava cedo, fazia o café e servia aos cinco filhos. Pediam a benção e ela os abençoava com ternura. Severina amava seus filhos e os filhos amavam Severina.

Vivia assim Severina, cuidando dos filhos e levando a vida. À noite Severina era a mais bonita e saía para o trabalho. Ela voltava sempre, passava no mercado e comprava o trigo, o leite, o arroz e o feijão.

Gilmar Leite vivia em conformidade com o artista romântico, com o “mundo cruel”, com uma série de procedimentos de fuga, dando voz à Severina Branca, cujo silêncio da noite é a única testemunha daquela vida de muitos pecados. Já que a sociedade não quer escutá-la ou não sabe compreendê-la, já que ela está perdida numa realidade incômoda e brutal, já que a tentativa de escapar dessa noite silenciosa está abrindo seu coração para as amarguras da vida.

De alguma maneira, o lirismo desse poeta pernambucano alcançou o grau laudatório dos grandes poetas românticos, conduzindo seus versos para o encantamento, revelado na voz de Severina Branca.

Então, esqueçam os momentos tristes da vida e plante uma semente de amor no coração das pessoas. “Paz no céu e na terra, paz entre todos os povos, paz nos nossos corações” (Papa Francisco).