Explosão de caminhão tanque reabre crise do gargalo viário que isola o Sul do estado

Da Redação

Um caminhão-tanque tombou e pegou fogo no Morro dos Cavalos, em Palhoça, no domingo (6), interditando a BR-101 por horas, queimando dezenas de veículos e deixando o Sul de Santa Catarina isolado. O acidente reacendeu a revolta da população e das lideranças políticas e empresariais com o atraso de décadas na solução definitiva para o trecho, que continua sendo um gargalo logístico estratégico para o estado e para o país.

A via, que conecta a Grande Florianópolis ao Sul catarinense e ao Rio Grande do Sul, é formada por uma pista simples de ida e volta. Quando bloqueada — por acidente ou deslizamento —, compromete o abastecimento, o turismo, o escoamento da produção e a mobilidade de milhares de pessoas. “Faixas adicionais numa rodovia com esse grau de importância são paliativos inaceitáveis”, disse o presidente da Fiesc, Mario Cezar de Aguiar, após o acidente.

Sem saída, sem plano B

Com a rodovia totalmente interditada, motoristas que seguiam em direção ao Sul foram obrigados a improvisar rotas alternativas por estradas rurais e pequenas cidades, não preparadas para o fluxo. Alguns demoraram mais de nove horas para conseguir chegar a Criciúma. É mais um capítulo da longa novela que se arrasta desde 2010, quando o projeto de duplicação da BR-101, com a construção de dois túneis e dois viadutos no Morro dos Cavalos, foi concluído. A licença de instalação foi emitida em 2014, mas a obra nunca saiu do papel.

Segundo a Fiesc, a solução definitiva já está prevista e autorizada, bastando “atualizar os projetos e executar a obra”, que poderia ser feita pela CCR, concessionária do trecho Sul. A proposta tem apoio por considerar que o valor do pedágio nesse trecho é inferior ao da Arteris no Norte, o que reduziria o impacto tarifário sobre os usuários mesmo com o investimento estimado em R$ 1,2 bilhão.

Falhas de fiscalização e risco permanente

A falta de ação não se resume à obra não realizada. Um histórico de denúncias expõe falhas graves na fiscalização e no monitoramento da encosta. O deputado estadual Mário Motta (PSD) cobra providências desde 2023. “Esses pontos de risco são verdadeiras bombas-relógio, que podem ruir a qualquer momento”, alertou. Ele responsabiliza a concessionária Arteris Litoral Sul e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) por classificações equivocadas de risco em encostas onde ocorreram deslizamentos em 2022 e 2024.

Conforme relatório técnico, os pontos de deslizamento haviam sido considerados de risco zero ou um — ou seja, sem perigo iminente — e foram excluídos do contrato de obras da concessionária. Dos R$ 42,9 milhões inicialmente previstos para intervenções, R$ 37,7 milhões foram retirados com base nas informações da própria Arteris. A ANTT, que validou as avaliações visuais das encostas, agora é alvo de auditorias pela CGU, TCU e MPF. Todas as ações ainda estão em tramitação e nenhuma medida efetiva foi adotada até o momento.

Trinta anos de enrolação

Para o jornalista Adelor Lessa, o acidente de domingo é mais uma tragédia anunciada. “O estado catarinense fica dividido, o Sul do país fica desconectado”, resumiu. Segundo ele, os entraves históricos na construção dos túneis foram atribuídos à presença indígena, mas os próprios indígenas, segundo o autor, sempre apoiaram a obra. “Índio não tem microfone, não tem poder. Então, falaram por eles”.

A indignação é unânime entre os que dependem da rodovia. “Estamos à mercê da sorte”, conclui Lessa. Lideranças pedem ação urgente do governo federal e da bancada catarinense no Congresso. Enquanto isso, o Sul do estado segue refém de uma única passagem frágil, insegura e mal fiscalizada.