Argentina: a luz no fim do túnel é um trem desgovernado.
No último domingo os argentinos participaram de suas prévias das eleições nacionais. No sistema eleitoral argentino, as prévias servem para indicar quais candidatos deverão disputar as eleições nacionais no mês de outubro e servem de termômetro para o resultado daquele pleito. De forma geral, dentro de um mesmo partido, que tem suas divisões políticas internas, diversas chapas eleitorais se apresentam. As primárias, além de servirem para eliminar as chapas dentro de um partido, também eliminam chapas nanicas: se uma chapa não obtiver mais de 1,5% dos votos, não poderá concorrer. Como neste ano nenhum partido ou coligação apresentou mais de uma chapa, portanto, as prévias serviram como termômetro das intenções de voto dos argentinos para outubro.
Os resultados apontam para uma vitória muito provável do kirchnerismo, com a ex-presidente Cristina Kirchner como vice em uma chapa encabeçada pelo advogado Alberto Fernandéz. Tudo estaria muito bem, não fosse a política kirchnerista o catalisador de problemas econômicos estruturais que há muito assolam a Argentina. Não bastasse a inépcia na gestão econômica, ainda há suspeitas de fraudes nas eleições de Cristina em 2007 e 2011 que incluem envolvimento de dinheiro venezuelano além do assassinato do procurador Alberto Nisman na véspera de sua denúncia contra a então presidente por conluio com o Irã para encobertar o atentado à bomba na Associação Mutual Israelita Argentina (Amia) nos anos 90, um caso que já envolveu inclusive ordem de prisão à atual candidata a vice-presidência.
Nesta conjuntura sombria, não é de espantar que o pânico tome conta do mercado argentino e, por conseguinte, leve o Brasil junto. O Índice Merval, da Bolsa de Valores de Buenos Aires, caiu quase 38% na segunda feira 12/08, como pode-se constatar no gráfico abaixo. No dia seguinte, ele já ensaiava uma recuperação em torno de 5%, porém o estrago estava feito: não apenas o mercado argentino sofreu, ADRs argentinos nos mercados estrangeiros tiveram forte desvalorização e o dólar chegou a ser cotado a 60 pesos argentinos. Há um temor generalizado de que Fernández-Kirchner repita o receituário heterodoxo de política econômica, como congelamento de preços (medida também adotada por Maurício Macri e que entregou resultados terríveis, como de praxe), restrição no acesso ao dólar, concessão de subsídios e restrição de exportações de grãos.
As consequências para o mercado brasileiro
No Brasil, no pregão após o resultado das prévias o Ibovespa recuou 2%, fechando aos 101,9 mil pontos. O dólar subiu 1,09% e encerrou o dia a R$ 3,98 após ultrapassar a barreira dos R$ 4. A situação argentina não é a única a causar tensão. Há um clima de aversão ao risco no mercado internacional, decorrente da tensão gerada pela guerra comercial entre EUA e China que também tem prejudicado o mercado brasileiro.
Expectativas para a Economia I
O relatório Focus divulgado no dia 12/08 trouxe o comportamento semanal das previsões para índices de preços, atividade econômica, câmbio, taxa Selic. O mercado revisou ligeiramente para baixo a expectativa de crescimento do PIB, de 0,82% para 0,81Os analistas do mercado financeiro revisaram para baixo suas expectativas para a taxa SELIC, de 5,25% para 5,00% ao ano até o fim de 2019. Quanto à inflação, mensurada pelo IPCA, também houve revisão das expectativas: o mercado considera que o IPCA pode atingir 3,76% até o fim de 2019. Há quatro semanas o mercado considerava que o fechamento de 2019 para o IPCA seria de 3,82%. O valor esperado para o dólar até o fim do ano se manteve no mesmo ao que se acreditava há um mês atrás, com uma taxa de câmbio de 3,75 R$/US$ no fim de 2019.
Expectativas para a Economia II
O Banco Central divulgou o IBC-Br, uma espécie de prévia da atividade econômica trimestral, que mostra uma retração de 0,13% no segundo trimestre do ano. O recuo foi verificado em relação ao primeiro trimestre do ano e calculado com ajuste sazonal. Como o primeiro trimestre apresentou queda de 0,2% no PIB, é possível que o país esteja entrando na situação conhecida como recessão técnica: dois trimestres seguidos de queda da renda agregada (PIB). Possível, mas pouco provável. A variação mensal ajustada mostra queda no mês de abril, mas crescimento nos meses de maio e junho, com o índice de junho crescendo 0,30% em relação a maio e este crescendo 1,1% me relação a abril. Portanto, também é possível que a economia ensaie uma recuperação.
Economista Ismael Cittadin – Professor do curso de Ciências Econômicas da UNESC, mestre em Economia do Desenvolvimento pela PUCRS e doutorando em Economia pela UNISINOS – Contato: ismaelcittadin@gmail.com