O Instituto Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal, criado na última legislatura, faz um trabalho excelente de projeção de indicadores econômicos e de leitura de conjuntura. Seu relatório mais recente, de maio de 2019, não é lisonjeiro sobre o desenrolar da economia. Depois das incertezas das eleições de 2018, um clima de otimismo perpassou os agentes econômicos durante algum tempo, otimismo este que deu lugar a um pessimismo com a capacidade do governo em entregar as reformas necessárias, em parte por algumas trapalhadas do Executivo, em parte por má vontade e senso de oportunismo do Congresso.

Contexto Macroeconômico

O IFI reduziu drasticamente sua previsão de crescimento do produto interno bruto em 2019 de 2,3% para 1,8%. Nas palavras do próprio instituto “o menor crescimento esperado para o PIB no biênio 2019-2020 ocorre em função da demora na retomada da expansão cíclica da economia. Com efeito, a atualização do cálculo do hiato do produto pela IFI revela uma ociosidade ainda relativamente elevada nos fatores de produção. De acordo com o exercício realizado, o hiato do produto fecharia apenas em 2021, mesma constatação feita quando da revisão do cenário realizada em novembro passado. Ou seja, no curto prazo, a economia tende a operar abaixo do crescimento potencial”.

Para quem não está familiarizado ao linguajar técnico dos economistas, o hiato do produto pode ser traduzido simplesmente por capacidade ociosa. Ou seja, a economia está estagnada, com um grande volume de máquinas e equipamentos parados por simples falta de demanda. Isto explica o indicador de FBCF (Formação Bruta de Capital Fixo) divulgado pelo IPEA recentemente: tivemos uma alta de 0,6% nos investimentos em capital produtivo no primeiro trimestre de 2019 com relação ao último trimestre de 2018, mas tal alta se deve basicamente a outros setores que não o de máquinas e equipamentos, como construção civil. Isolando máquinas e equipamentos, tivemos um desinvestimento de -1,5% no primeiro trimestre do ano.

Portanto, a indústria brasileira segue operando com elevado grau de ociosidade. Como consequência do baixo dinamismo da produção, o nível de utilização da capacidade instalada (NUCI) da indústria, calculado pela FGV, permanece em patamar ainda bem abaixo de sua média histórica (80,1%). Entre março e abril, na série com ajuste sazonal, o indicador recuou 0,2 ponto percentual, atingindo 74,5.

Situação Fiscal: lado da receita

Esse contexto de baixa atividade econômica dificulta a entrega de resultados fiscais favoráveis devido a diminuição de receitas, obrigando o Governo Federal a apelar aos agora famosos, incompreendidos e convertidos em munição de narrativas políticas toscas, contingenciamentos no orçamento. Segundo o IFI, no mês de março de 2019, as séries de receita já apresentam desempenho pior do que o observado ao final de 2018. A variação real das receitas líquidas, entre março deste ano e março do ano passado, foi de apenas 0,7%. Já a alta real entre os totais acumulados no ano até março de 2018 e até março de 2019 foi de apenas 0,1%. São dados preocupantes, pois sinalizam que a atividade econômica ainda não está em recuperação efetiva.

Situação Fiscal: lado da despesa

O Governo Federal vem fazendo algum esforço para a contenção da trajetória de gastos. As despesas discricionárias, ou seja, as que o governo pode escolher fazer ou não, como investimentos em infraestrutura ou aquisição de veículos ou equipamentos para as Forças Armadas, já diminuíram em R$ 66 bilhões de 2014 até março de 2019. Porém, as despesas obrigatórias, que o governo não tem escolha se não executar, já aumentaram R$ 91 bilhões no mesmo período. Para se ter noção, as despesas discricionárias representam proporcionalmente 10,15% das obrigatórias, que atualmente somam R$ 1,260 trilhão. Deste bolo, 70% são gastos com pessoal (salários) e previdência – pública e privada.

Se o cenário atual persistir, ou seja, sem reforma da previdência e a consequente manutenção da estagnação econômica e diminuição de receita, o descumprimento do teto de gastos deve ocorrer em 2022 e a deflagração de gatilhos podem gerar risco para o funcionamento do Estado. De acordo com o IFI, o efeito dos gatilhos recai, principalmente, sobre os gastos com pessoal. A Emenda Constitucional 95, que instituiu o teto de gastos, determina que as despesas com pessoal ficarão praticamente estagnadas, no caso de descumprimento do teto, uma vez que novas contratações serão permitidas apenas para reposição de servidores efetivos e reajustes salariais estarão proibidos. Ainda que o próprio texto constitucional fixe uma recomposição anual para a remuneração dos servidores, não há previsão de valor mínimo para essa taxa. No limite, ela poderia ser, inclusive, inferior à inflação. Assim, é provável que o acionamento dos gatilhos da EC 95 é a manutenção, em termos nominais, dos gastos com pessoal. A alternativa a um controle dos gastos com pessoal seria um corte drástico nas despesas discricionárias, o que significaria um shutdown, ou paralização da máquina pública. Portanto, não há cenários otimistas sem reformas, e não há passeatas contra os “cortes” na educação que mudem esta realidade.